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sábado, 3 de janeiro de 2015

Melhor pior texto



Odeio as palavras tanto quanto as amo. Odeio o fato delas sempre escorregarem das minhas mãos e nunca se moldarem no texto exatamente da forma que eu quero. Odeio o fato de nunca conseguir encaixar as frases da forma que me agradaria mais, quanto mais tento uni-las mais elas escapam e voam em um caos que para mim parece quase infinito. Odeio o modo como nunca sei atar os nós do texto da forma certa, nenhum adjunto, vírgulas, pontos, anáforas, elipses e companhia parecem ter harmonia naquilo que escrevo.

Odeio o fato de que nunca consigo sentir que me expressei como queria num texto. Odeio principalmente a ideia de que neste exato momento você está lendo este texto que não está moldado da forma que me deixaria satisfeita. Só de pensar que agora uma leitura deste texto feita por alguém que não seja eu mesma consegue encontrar mais problemas que fogem aos meus olhos me perturba, sinto vontade de prender todas as palavras até domesticá-las, quem sabe domá-las como se doma um leão.

Sei que nesse exato momento alguém está achando uma vírgula fora do lugar, um acento que falta, algum problema de ambiguidade talvez, algum conceito mal colocado, orações longas demais ou até mesmo o leitor ache este texto chato e clichê. Odeio o fato de que até chegar aqui cortei parágrafos, risquei frases, substitui palavras e reli o que já tinha escrito.

Mas amo as palavras como jamais poderia amar alguma outra coisa que me dê tanta dor de cabeça. Dizem que criar filhos traz algumas dores de cabeça, então talvez as palavras sejam como filhos. Por mais que queiramos moldá-las ao nosso próprio modo elas sempre acabam assumindo sua própria forma em um texto. Trabalhamos duro com elas para sempre fazer com que o texto vá para o melhor caminho, e no final podemos ser surpreendidos por algo maravilhoso. Um texto também sempre terá a marca do estilo de quem o escreveu, por mais que tentamos fazer algo soar neutro nossa marca pessoal sempre será possível de ser notada, assim como os filhos no final sempre acabam lembrando de alguma forma os seus pais.


Amo as palavras porque elas são transformadoras, podem fazer total diferença no mundo e somos capazes de construir nos mesmos e a sociedade que nos cerca através delas. Porém se for para falar de ódio vou dizer que no fundo odeio como as palavras construíram este texto. Odeio o fato de que sinto que há muitas coisas que não expressei nele ou o que foi dito não foi feito da maneira que eu queria. Odeio a ideia de que talvez este texto seja bastante clichê e mal escrito. Por fim se for para falar de amor às palavras vou dizer que amo este texto porque talvez ele seja o melhor pior texto que já escrevi.